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quarta-feira, fevereiro 25, 2009

Observatório meteorológico em Porto Alegre.

Na cidade de Porto Alegre, para a primeira metade do século XIX, já existem documentos relatando informações sobre meteorologia. Esses documentos são pouco detalhados, sendo difícil construir com eles uma série temporal. Os registros mais regulares começaram a ser produzidos a partir de 1893, com o inicio do funcionamento do Observatório da Secretaria de Obras Publicas, sob a direção do engenheiro Dr. Afonso Herbert.
Localizava-se no torreão norte do edifício cito à praça Marechal Deodoro (atual praça da Matriz, Centro). Atualmente este edifício tem o apelido de “Forte Apache" encontra-se na esquina da rua Jerônimo Coelho com a referida praça. Azambuja (1893) cita uma série com dados de temperatura média mensal, precipitação total mensal, pressão atmosférica mensal, para todo o período de funcionamento deste observatório, (1893 – 1913). O autor também comenta que era monitorada a altura do lago Guaíba, mas os documentos consultados não trazem nenhum dado quantitativo sobre estas medições”.


No “Relatório de Negócios e Obras Públicas” de 1895 Herbert faz a seguinte descrição, sobre os instrumentos do observatório:


Continua funcionando regularmente o observatório meteorológico havendo entretanto, por motivos imprevistos, algumas faltas de registro do anemometro e do anemoscopio como sejam: polarisação das pilhas e desarranjo do mechanismo dos aparelhos.
Com a chegada dos tubos para o barometro a mercúrio registrador (grande modelo) entre os quaes sómente um chegou em bom estado, foi montado o dito barômetro, que funciona com perfeição desde abril.
O serviço de signaes indicando a hora média ao meio dia, teve de ser interrompido, devido a irregularidade que repentinamente manifestou-se na marcha dos chonometros, aliás muito antigos.
Esses chonometros foram enviados á casa Fonseca, Machado & Irmãos, do Rio de Janeiro, afim de serem consertados se a isso se prestarem.
O chonometro n. 11 da Sociéte Genevoise du Locle, depois de sofrer alguns retoques nas oficinas de Jeanneret & Krentel, acha-se atualmente em observação, afim de determinar-se com precisão sua marcha, servindo desde já o mesmo para o serviço de signaes mencionados, que foram encetados em 10 do corrente.
Depois de concluídas as obras do edifício d’esta repartição serão montado no torreão sul o electometro de Mascarat, que necessita de uma camara escura.


Os dados dos registros, produzidos neste observatório, eram enviados a vários jornais, mas Herbert comenta que somente os jornais “A Federação” e o “Deutsche Zeitung” publicavam regularmente essas informações meteorológicas.







quinta-feira, fevereiro 12, 2009

Prognostico do tempo

Houve um homen de espírito na Europa que apostou com outro affirmando que nenhuma mentira ou mystificação, por mais absurda e arrojada que fosse, deixava de encontrar crédulos; e ganhou a aposta.
Anunciou elle que descobrira um meio de produzir e multiplicar as carpas artificialmente, e que uns poucos grammos de certo pó, que inventara ao cabo de longos annos de estudos e de experiências eram sufficientes, sendo lançados em tanques de água limpa, para enche-lo no fim de um ano, de numerosas e boas carpas.
Involvia isto nada menos que do que a resolução do maior problema da chimica organica – a produção artificial de vida.
Mas não enxergaram isto os ignorantes. Sem embargo do desdem dos homens competentes e do alto preço dos taes pós – choveram os compradores.
Devolvendo a um dos freguezes o dinheiro destinado a um dos frasquinhos do pó maravilhoso – disse o seu inventor: Nada inventei. As carpas se reproduzem e multiplicam como os outros peixes da sua espécie. Apostei apenas que todas as mentiras encontram crentes. Ganhei a aposta. Estou satisfeito. Ahi vai o seu dinheiro. Agradeço-lhe o ter contribuido para a minha victoria. Não fique triste por este facto; console-se um tanto. Antes de sua encommenda eu já recebera mais de uma centena de pedidos iguaes.
O numero de credulos é immenso.
Recordamos isto a proposito dos prognosticos do tempo que se encontram em algumas folhinhas e almanachs de distribuição gratuita para o reclame e annuncio de remedios, prognosticos que encontram entre nós (vergonha é dize-lo) uma notoria fé, uma pasmosa credulidade.
Nos paizes adiantados como a França, a Inglaterra, a Bélgica, etc. onde os serviços públicos estão melhor organizados do que entre nós e onde a meteorologia tem já a importancia de que é digna há repartições centraes que recebem diariamente communicações telegraphicas da temperatura e humidade do ar, pressão atmosférica e ventos reinantes nos principaes pontos do respectivo territorio e dos territorios visinhos e que em vista destas communicações anunciam o tempo provavel para o dia seguinte annuncio que, segundo o clima do paiz, importa muitas vezes na previsão do tempo para dous ou tres dias proximos.
O Times, em Londres, publica estes annuncios firmados com a assignatura do secretário da repartição meteorológica, e o mesmo fazem quase todos os grandes jornaes diarios, quer em Londres, quer em muitas capitais e cidades importantes da Europa.
Esses prognosticos fundados em base incontestadas e feitos apenas com vinte e quatro horas ou pouco mais horas de antecedencia, verificam-se na maioria dos casos e previnem, por vezes, muitos desastres annunciados a aproximação e iminencia de tempestades que poderiam ser fataes a navios que estão a partir.
Mas falham outras vezes e de um modo notavel – parecendo-se, então, o tempo annunciado com o real tanto como um ovo com espeto como se diz vulgarmente.
Ora, si as previsões do tempo assim determinadas (e só para o dia seguinte) são apenas mais ou menos provaveis, como é possivel que se prognostique o tempo, como fazem as folhinhas e almanachs alludidos, com um ano de antecedencia, e isto para um paiz vasto como o Brazil, que tem, disseminados por sua superficie, uma grande variedade de climas?!
Sabem todos aquelles que tem viajado pelo interior do imperio a diversidade dos nossos climas. Devem estar na lembrança de todos as horrorosas secas que assolam por vezes uma, duas ou tres provincias do norte ao passo que no sul há abundancia de chuvas. Não devem tambem estar esquecidas as secas que as vezes ocorrem nesta provincia, no verão, sem que della se ressintam provincias mais proximas. A estação das chuvas no Rio de Janeiro, Minas São Paulo e Paraná é nos mezes de primavera e verão; inversamente aqui é nos meses de outmno e primavera. No anno passado tivemos nessa provincia um inverno abundantissimo em chuvas; no entanto lembramos ter lido uma carta de pessoa autorisada residente nos confins de Minas (Uberaba), datada do fim de agosto dizendo: Desde março que aqui não chove.
O mesmo vai para outras zonas do império; o clima de uma não se parece com o clima de outra. A climatologia do paiz alem de variadissima é mui pouca conhecida; em regra cada provincia conhece o seu clima, ignorando o clima de suas irmãs.

Fonte: Annuario da Provincia do Rio Grande do Sul
Para o ano de 1887.

quarta-feira, janeiro 21, 2009

Nota sobre a história da meteorologia gaúcha.

No estudo da climatologia histórica, a documentação mostra o inicio deste trabalho ligado às dificuldades encontradas pela administração da época, tais como o vazio demográfico e a dificuldade da implantação de um serviço estatístico, importante, como suporte para a observação. José Pedro César encarregado dos trabalhos estatísticos em 1831 enviou ao imperador o seguinte oficio:


A dificuldade dos meios para conseguir os dados, particularmente geográficos e os relativos à parte natural, deve-se ao fato de haver necessidade de trabalhos muito detalhados, viagens a lugares distantes e de difícil acesso, com despesas consideráveis. Como exemplo registra-se o fato que para se saber qual a temperatura de determinado lugar, havia a necessidade de se deslocarem até o local para fazer a medição da temperatura média, e essa observação deveria ocorrer pelo menos durante 20 anos para que se tivesse certeza do fato, resultando dessa forma, uma estatística imperfeita, porque, na falta dessa observação direta, era necessário recorrer a obras antigas ou ao conhecimento de algum cidadão ilustre da época.


Na primeira metade do século XIX algumas estações começaram a funcionar, gerando dados locais, mas não havia informações para classificar o clima do Rio Grande do Sul. O projeto mais antigo, até agora encontrado na documentação para a formação de uma rede meteorológica foi o iniciado em fins de 1883. O então chefe da Commisão de Melhoramentos da Barra do Rio Grande, o Dr. Honorio Bicalho, tratou de organizar um serviço meteorológico usando a rede de telégrafos, no total vinte cidades faziam parte desta rede.
Cada estação recebeu um termômetro de maxima e mínima (de six) de Negretti & Zambra, um barômetro aneroide de Casella, e um pluviômetro com aprovette graduada de Casella.
Em 1885 a Commisão de Melhoramentos, começou a organizar o material coletado, houve problema na qualidade dos dados, sendo necessário organizar um serviço para treinar os técnicos que faziam as coletas nas estações.
Provavelmente este foi o trabalho pioneiro para a geração de elementos que permitiu, na época, tentar definir o clima gaúcho.

quinta-feira, janeiro 15, 2009

Sobre fenômenos meteorológicos.

Atualmente ocorrem, no Rio Grande do Sul, fenômenos meteorológicos de grande intensidade, como chuvas de granizo e tormentas, com ventos muito fortes causando grandes prejuizos materiais e morte de pessoas. Os meios de comunicação, ao informarem a população, muitas vezes evidenciam a surpresa por não haver registro de fatos, na meteorologia gaúcha, com uma escala similar ao que tem ocorrido no presente,.
Pouco sabemos sobre o clima do Rio Grande do Sul no período histórico anterior ao século XX, mas documentos administrativos e relatos de viajantes trazem informações interessantes sobre este tema:
O viajante francês Saint Hilaire, também no seu diário fazia anotações sobre a meteorologia, no ano1821 registrou:

Tronqueira , 13 de abril: [...] Algumas horas antes do por do sol o céu apresentou-se coberto de negras e expessas nuvens e logo teve inicio um verdadeiro furacão, o mais terrivel que tenho presenciado em minha vida. A escuridão era tamanha que dificilmente podia ler. Por todos os lados o céu era riscado por relâmpagos. As trovoadas sucediam-se, sem interrupção, e o ronco do vento ultrapassava o ruído do trovão, dado a sua violência.
Nesse momento achava-me, em companhia do pequeno Diogo, na sala de meu hospedeiro. Estando aberto a janela e a porta, tudo que se achava sobre a mesa foi carregado pelo vento; corri a fechá-las, mas nesse momento, uma parte do telhado foi arrebatado e, apesar da casa ser nova, um pedaço da parede, construida com tijolo e barro, foi derrubada pelo furacão e emtulhado por cima de minhas malas. A água caia torrencialmente dentro da casa pedaços de talhas voavam ao redor de min [...] Ao fim de sete ou oito minutos a intensidade do furacão diminuiu. [...] Entrementes, chegaram Matias e Lourette. O primeiro contou-me que ao inicio do furacão encontrava-se, com Firmino, na carroça e que não obstante o enorme peso da viatura e a horizontalidade do terreno, fora lançada contra uma árvore que ela arrancara, sendo a coberta atirada longe.


No Quadro Estatístico e Geográfico da Província de São Pedro encontramos o seguinte relato: [...] a espantosa detonação que coincidiu com a elevação de uma tromba na foz do Jacuhy. Este fenômeno ocorreu em 1822, o viajante Michael George Mulhall, embora tenha percorrido o Rio Grande do Sul de pois desse período também cita, no seu diário, esse fato através de relatos colhidos entre os moradores de Porto Alegre.

O francês Nicolau Dreys faz a seguinte descrição de outro fenômeno:

Presenciamos no Rio Pardo uma tremenda chuva de pedras, e também foi êsse um dos mais furiosos furacões que temos visto nos dois hemisférios.
Num instante a vila não ofereceu senão montões de ruínas; todas as vidraças e grande parte dos telhados cairam quebrados, paredes inteiras foram derrubadas, e outras crivadas como pela metralha; todas as árvores das quintas ficaram reduzidas ao tronco principal, e muito gado morreu no campo adjacente

Dreys percorreu o Rio Grande do Sul entre 1817 e 1839, não especifica em que ano ele observou esta tormenta.

No Annuario do Estado do Rio Grande do Sul, Azambuja comenta o riogoroso inverno de 1885 :

O phenômeno de agosto de 1879 em Cima da Serra foi devido, si não nos enganamos, a uma grande tempestade que se fez sentir tambem na capital, na noite de 8 pra 9 de agosto, onde produzio muitos desastres no caes ancoradouro, tempestade que atravessou uma grande parte do Brazil fazendo sentir os seus rigores, conquanro com menos intensidade, nas provincias de Paraná e de S. Paulo e indo além até Uberaba e Goyaz.

Estes são alguns exemplos sobre uma grande quantidade de registros, muitos ainda desconhecidos dos historiadores e climatologistas.

sábado, dezembro 27, 2008

A queda de um meteoro em Alfredo Chavez, Rio Grande do Sul

Os fenômenos celestes sempre atraíram a imaginação popular, sendo fonte de muitas controvérsias. Ao longo do tempo, torna-se difícil para a ciência separar a lenda do fato cientifico e saber precisamente o que houve na época.
Este artigo visa discutir as notícias sobre a possível queda de um meteoro no Rio Grande do Sul, no ano de 1899, em Alfredo Chavez (atual município de Veranópolis).

A queda do meteoro

O jornal A Federação, em 1899, noticiou, em várias edições, o estranho acontecimento.
Na edição de 27 de março aparece a seguinte manchete “Bendegó no rio das Antas”, a noticia está assim detalhada:


Em dos dias da semana última caiu no rio das Antas um desses corpos sidereos, que solicitados pela atracção vem freqüentemente precipitar-se sobre a superficie do nosso planeta. A queda teve lugar entre Santa Bárbara e o ponto onde a estrada para Alfredo Chaves corta aquele rio.
Segundo nos informa pessoas fidedginas esse aerolitho obstruiu parte do rio e conserva ainda algum calor. O estrondo produzido pela queda foi ouvido em São João do Mo
ntenegro
[1].


No mesmo jornal, na edição de 10 de abril, do mesmo ano, consta que a seguinte matéria:


Meteorolitho.
Segundo ordens emanadas da secretaria de Obras Publicas, do Estado, seguiu no dia 10 de abril passado para Alfredo Chaves o engenheiro João Fernandes Moreira a fim de colher informações exactas sobre o logar onde poderia estar o meteorolhito, que diziam haver caído no dia 14 de fevereiro no Valle do rio das Antas, entre Santa Bárbara e o ponto em que a estrada de Bento Gonçalvez para Alfredo Chavez corta aquele rio.
Pelas informações recolhidas o Dr. João Fernandes Moreira seguiu no dia 17 para a Barra do Arroio “Jaboticaba”, que deságua na margem direita do rio das Antas, para obter noticias mais verdadeiras, pois diziam que o meteorolitho havia caído neste logar.
Nada sabendo sobre o tal aerolitho resolveu o Dr. Moreira seguir até o passo do rio das Antas na estrada de Alfredo Chaves a fim de informar-se do que ocorrera. Seguindo sempre pela margem direita desse rio indagava aos moradores qualquer notícia que o esclarecesse, até que encontrou um polaco de nome Valentin Taleska que disse: que na colonia número 40 ou 41, situada na margem esquerda do rio das Antas, pertencente ao italiano Giuseppe Cuncho, havia caido, mais ou menos por aquele tempo, pelas 3 horas da tarde, um enorme paredão, regulando ter 2700 m cúbicos; tendo sua queda determinado um grande estampido
Este facto, conforme fica acima narrado, o dr João Fernande Moreira retificou de ser inteiramente verídico, não tendo sido possível nem mesmo com um anneroide, determinar a altura da queda, que foi enorme.



Para esse mesmo ano (1899) estava em curso a noticia apavorante, divulgada em todo o mundo.
N a edição de A Federação, 15 de fevereiro de 1899, existe o seguinte artigo.

O fim do mundo.

Em 13 de novembro de 1899 encontro da terra com um grande cometa.
Morto pelo fogo, descargas elétricas.
Um profeta da sciencia moderna anuncia a morte de todos os habitantes do nosso planeta em 13 de novembro de 1899, das 2 para as 5 da tarde.
A noticia não admite gracejos, tanto mais quanto ella nos é transmitida por uma autoridade astronômica, digna de maior crédito, o Dr. Rodolphe Falb, astrônomo, professor de geologia da Universidade de Viena e da mathematica da de Praga.


O jornal A Federação publicou também matérias, nas edições de março, dias 14, 15 e 16, sobre a catástrofe. Os artigos detalham informações sobre a previsão de Rodolphe Falb a cerca do choque do cometa com a Terra. Nestes artigos existem detalhes técnicos e a identificação de Rodolfhe Falb como professor de geologia da Universidade de Viena. Enfatiza o articulista que o assunto é sério porque não se trata da fantasia de um estranho e sim dados de um respeitado cientista.

Na edição de 14 de março existe o parecer do Dr. Forester, diretor do observatório de Berlim e do Dr Cruls, diretor do observatório do Rio de Janeiro. Ambos afirmam que na data estipulada nada aconteceria a não ser uma queda de estrelas cadentes.

O jornal “O Estado” de São Paulo publicou uma matéria com o mesmo tema com o seguinte titulo “A propósito do fim do mundo”, edição de 11 de novembro de 1899. Neste artigo esta descrita a previsão de Rodolphe Falb, a qual diz que no dia 13 de novembro o cometa Biela, cem mil vezes maior que a Terra, deveria chocar-se com ela “não sobraria ninguém para contar a história pois a humanidade seria aniquilada”. O artigo descreve o pânico que se disseminou pela população, perante esta noticia, com casos trágicos.



Conclusão.

O assunto aqui discutido sobre a queda de um meteoro, no município de Alfredo Chavez, foi oficialmente arquivado pela administração do estado na época. O caso foi definido como um boato, segundo o relatório de João Fernandes Moreira não houve comprovação do fato.
Fica o questionamento, realmente nada houve? ou a posição das autoridades foi cautelosa, devido aos problemas que já havia em função da crise provocada pela previsão de Rodolphe Falb.


[1] São João do Montenegro está situado aproximadamente entre 40 e 45 km do local da queda.

domingo, dezembro 14, 2008

As influencias do fenômeno meteorológico de 1878 no município do Rio Grande, localidade do Taim.

Sobre o conhecimento de fenômenos meteorológicos como grandes precipitações, ondas de frio, nevascas, ou secas fortes, ocorridas no Rio Grande do Sul durante o século XIX, a literatura historiográfica gaúcha tem poucos estudos. Também a análise de como era, naquele século, o ambiente natural aqui no estado ainda carece de um estudo sistematizado.
Apenas registros pontuais, feitos na época, principalmente por viajantes, são mais encontrados. Dentro da produção científica gaúcha as ciências, sobre este tema, surgiram ou tornaram-se conhecidas só a partir do inicio do século XX. A meteorologia, por exemplo, é uma prática que oficialmente começou em 1909 com a fundação do Observatório da Escola de Engenharia de Porto Alegre, pouco sabemos como era o clima gaúcho nos séculos anteriores.

Entre os diversos registros documentais de eventos extremos ocorridos no Rio Grande do Sul ao longo do século XIX, a maioria ainda não descrita na literatura, consta que em 1878 houve intensas chuvas na região que hoje corresponde aproximadamente ao município do Rio Grande, havendo registro de grandes alterações ambientais na localidade do Taim, onde estão as lagoas Caiuvá e Flores .


A influencia da enchente de 1878.

Sobre esta grande enchente na literatura aparece uma detalhada descrição e as conseqüências no ecossistema, em especial das duas lagoas citadas, e na comunidade local.
T. F. Mello faz a seguinte narrativa dos efeitos destas chuvas:


Em 14 de novembro de 1878, uma chuva torrencial, verdadeira avalanche, desabou sobre o districto do Tahim, no município do Rio Grande; as águas das lagoas Flores e Cayuvá cresceram de maneira descommunal, attingindo em poucas horas a 4 metros acima do nível ordinário, ligando-as em alguns pontos com a Mirim e cobrindo quase todo o terreno elevado que as divide.
Algumas famílias moradoras nas proximidades foram victimas da innundação, entre elas a do cidadão José Bernardes Cardoso, composta de esposa e 8 filhos menores, que foi colhida pelas águas e desappareceram na voragem.
Grande quantidade de gado vaccum, cavalar e lanígero foi arrastada pelo turbilhão, que rolava campo fora com medonha violencia, destruindo e arrancando, arrasando tudo que encontrava em sua passagem devastadora.


Para esse mesmo ano, R. Brasiliano também cita uma grande chuvarada, que produziu uma enchente no arroio Taim causando desmoronamento e obstrução do sangradouro.

Mello comenta a grande alteração da paisagem local, após este acontecimento. Segundo este autor as lagoas Caiuvá e Flores eram ligadas a lagoa Mirim pelo arroio Taim, que funcionava como um escoadouro natural. Este arroio iniciava na parte ocidental da lagoa das Flores e percorria 6 km até a lagoa Mirim, alcançando esta nas coordenadas de 32º de latitude e 9º 28´00 de longitude (coordenadas do Rio de Janeiro).

As margens deste arroio eram guarnecidas por uma mata, formada por arbustos e pequenas árvores, e o entorno cercado por campos, que na época eram usados para a prática da pecuária. Em condições normais a profundidade máxima do Taim era de 2 m, durante o período de cheias o nível da água subia de 4 a 5 m, nestas condições iates percorriam até 5 km além da foz.

O historiador João Borges Fortes mostra, na carta de Paes Leme, uma clara citação deste arroio:


Examinando a carta de 1737 se evidencia que a costa oriental da Lagoa Mirim devia ser conhecida dos espanhóis e que Paes a explorou. Verifica-se isso: primeiro, de sua ordem para que embarcações apropriadas subissem o sangradouro de São Gonçalo, e fossem encontra-lo, provavelmente, no passo da Borda da Mirim, dentro do posto avançado do arroio Taim, a que se encontra detalhada alusão na carta ao vice-rei


O naturalista francês Saint-Hilaire quando passou pela região em 1821, fez a seguinte descrição da paisagem:


Comecei a viajar pela península que separa a lagoa Mirim do mar e que tem a mesma direção que sua homóloga existente entre lagoa dos Patos e oceano
[...] Durante alguns instantes só pisamos areais, em seguida caminhamos sobre um gramado raso; contudo, principalmente à direita, percebemos ao longe grandes areais.
Apesar da igualdade do terreno o aspecto do campo nada tem de monótono. Grande número de cavalos e bovinos pastando [...] Abaixo do Caiová o istmo começa a estreitar-se [...] A uma légua de Capilha acha-se o lugar denominado Tahim [...] Para completar essa pequena descrição devo acrescentar que ao chegar à guarda de Tahim atravessei um regato denominado Arroio Tahim, cujas nascentes estão na parte meridional do banhado setentrional do lago do
[1]Albardão e que estabelece comunicação entre esse lago e a Mirim.


Pelas informações que os moradores forneceram a Saint-Hilaire, a lagoa das Flores não foi citada, provavelmente era vista como parte de um sistema maior.

Dreyz, viajou muito, na primeira metade do século XIX, pela então província do Rio Grande do Sul. Numa passagem assim ele descreve a região do arroio Taim:


[...] por isso que, da parte oriental não aparece água corrente alguma que se pudesse contar entre os rios, nem os afluentes das lagoas, pois não se pode chamar rios a alguns esgotadouros acidentais das águas estagnadas, como o Taim, na Lagoa Mirim, o qual não é senão o escoadouro da [2]Lagoa Saquarema. [...] a península do sul está ainda ocupada, no seu centro, pela já citada Lagoa Saquarema, que se prolonga na direção de Norte a Sul, sendo que fora das mesmas circunstancias físicas, ela não passa de uma continuidade de pântanos, comunicando-se entre si por parte mais ou menos inundadas, ao mesmo tempo que se acha em relação com a lagoa pelo arroio Taim..


A maneira como Dreyz se refere à lagoa Mangueira, pode significar duas coisas, ou a cartografia da época não havia detalhado a hidrografia, mostrando as lagoas Caiuvá e Flores como corpos d´água distintos, ou o ecossistema local era diferente.
Na obra deste autor podemos ver um mapa da Província do Rio Grande do Sul de 1839, onde aparece a lagoa Mangueira como “um sistema continuo” ligada, ao norte, à lagoa Mirim pelo arroio Taim.

Azambuja define o Taim, como um canal de descarga entre a lagoa das Flores e a lagoa Mirim. Enfatiza ele a influencia que este arroio tinha, na hidrografia local, inclusive em relação à lagoa Mangueira. Ele cita a obra “do historiador Resende Silva”, autor de um trabalho especializado sobre a região, o qual diz que nos tempos coloniais o leito deste arroio servia de limite oriental dos campos neutrais.

Segundo Melo e Resende Silva, após a grande enchente de 1878 a paisagem local começou uma grande transformação. Relatam eles que no dia 15 de novembro um forte vento de SO represou as águas das lagoas, o nível das águas baixaram devido à ação conjunta do vento e da insolação. No dia 18 podia-se observar grande quantidade de areia, troncos e diversos detritos que tinham obstruído a entrada do escoadouro isolando o canal da lagoa. Em aproximadamente 8 anos o arroio Taim ficou totalmente soterrado.

Após o soterramento do arroio grandes dunas com até 16 m de altura surgiram no local, os campos do entorno converteram-se num cinturão, com um perímetro entre 6 e 8 km, de banhados. Surgiram dois pequenos córregos um denominado pelos moradores, da localidade do Taim, de Figueira Torta o outro, denominado Aguirre, surgiu à oeste do rincão do Tigre. Estes dois córregos, devido ao pequeno tamanho e a topografia não substituíram, como canal de escoamento, o arroio Taim limitando-se a drenar parcialmente as águas do banhado.
Esta enchente não foi um fato isolado, a documentação da época mostra o registro, para o mesmo ano, de grandes inundações em Porto Alegre, e outras partes do Rio Grande do Sul.


As causas das enchentes de 1878.

O El Niño é apontado como responsável por um período de precipitações, no Rio Grande do Sul, acima da média do estado. No modelo, em nível hemisférico, é aceito que no período da manifestação do fenômeno existe uma relação entre intensas chuvas na costa oeste da América do Sul, em especial no Pacífico equatorial, secas fortes no nordeste brasileiro e intensas chuvas no Rio Grande do Sul,.

O ano de 1878 está de acordo com este modelo, no qual houve a ocorrência de intensas chuvas no Perú, uma forte seca no nordeste brasileiro, e a ocorrência de fortes chuvas, seguidas de inundações, em diversas partes do Rio Grande do Sul. De acordo com o quadro de registros históricos (CPC/NCEP/NOAA, 2001) o ano de 1878 foi de El Niño forte.

Nos anos de El Niño o período mais intenso da manifestação do fenômeno, no Rio Grande do Sul, ocorre entre outubro e novembro estando portanto de acordo com os dados históricos apresentados neste artigo.

[1]Designação que os portugueses davam para a lagoa Mangueira.
[2] Palavra derivada de Squarembó, designação que os indígenas davam à lagoa Mangueira.

quinta-feira, dezembro 11, 2008

El Gran Seco.

Sobre grandes anomalias climáticas ocorridas no passado, na América do Sul, em tempos históricos, ainda falta um estudo detalhado de recuperação de documentos sobre este tema. Um relato muito interessante é do naturalista inglês Charles Darwin. Em seu diário faz menção a uma grande seca ocorrida entre 1827 e 1830, na Argentina, este período ficou conhecido como “gran seco”. Em base de relato dos habitantes ele cita que a parte norte da província de Buenos Aires e parte sul de Santa Fé, foi a mais atingida os rios da região secaram. Um grande número de animais pereceu tanto gado como animais da fauna.
Somente na província de Buenos Aires avaliou-se que um milhão de animais bovinos morreram. Na última fase do “gran seco” navios traziam animais para o consumo da população. Segundo os moradores da região, milhares de animais bovinos correram para o rio Paraná exaustos morriam atolados na lama das margens. A bifurcação do rio que passa por São Pedro ficou tão cheia de carcaças de animais que o cheiro insuportável dificultava a navegação. Também a seca aumentou a salinidade dos rios, da bacia, tornado-os venenosos o que teria contribuído para matar também muitos animais. Darwin usa as anotações do naturalista espanhol D. Felix de Azara que descreve o quadro onde manadas de cavalos que invadiam os pântanos pisoteando uns aos outros e morrendo afogados e de exaustão, Azara comenta que em uma ocasião viu cerca de mil animais mortos dessa forma.